Sedutor mentiroso e compulsivo. Reconheça e fuja dele.
A arte da sedução pode se tornar um vício? A conquista amorosa sequencial pode ser enquadrada como uma conduta nociva? Se você já encontrou no seu caminho um homem com a chamada Síndrome de Don Juan, aquele sedutor irreparável, ambas as respostas são sim. O fenômeno não é novo — o próprio nome Don Juan faz alusão a um conhecido personagem, cujo primeiro registro na literatura aparece no século XVII, na obra do espanhol Tirso de Molina. Porém, foram acrescentadas a esse comportamento duas palavras que, até tempos atrás, não eram utilizadas: masculinidade tóxica. “Ela faz com que alguns homens desenvolvam um transtorno narcisista: querem ser admirados, sentem-se superiores e lhes falta empatia. Eles não amam as mulheres, mas sim a conquista”, explica o pesquisador da psicologia da masculinidade preta e questões raciais, João Luiz Marques.
Priscila, que chegou a lançar um livro sobre esse episódio chamado “Can@lha.com”, conta que até hoje dá suporte a pessoas que atravessam situação semelhante. “Enquanto houver a idealização do modelo romântico, vai existir brecha para o Don Juan entrar em ação. Costumo dizer que as mulheres precisam de apoio”, reflete.
A influenciadora digital Jacy Lima, de 28 anos, viu-se prestes a submergir nessa areia movediça. “Bastou eu me apaixonar, para esse meu namorado cair fora. Depois, ele me contou que seduzia as amigas da mãe e até as namoradas de amigos. Era compulsivo. Percebi, então, que tinha essa síndrome”, conta Jacy. Para ela, as redes sociais possibilitaram que debates e problemáticas sobre relacionamentos viessem à tona. “No meu canal do YouTube e no perfil do meu Instagram, recebo milhares de depoimentos e exposições de relações fracassadas que levam à dependência”, explica. “O Don Juan mantém as mulheres nas mãos na intenção exclusiva de alimentar o próprio ego. Mas isso precisa ter limite. Do contrário, pode se tornar uma relação tóxica e até abusiva”, alerta Jacy.
A psicóloga Daniela Faertes ressalta que o Don Juan pode ser ele ou ela. Em comum, está a liberação de endorfina, que, ao contrário do que se imagina, não acontece no sexo.“O prazer reside na conquista. Também são indivíduos com dificuldade de criar vínculos afetivos e que tendem a escolher suas ‘vítimas’ em relações que envolvam algum tipo de proibição ou dificuldade, como médico e paciente, cliente e advogado”, explica. Daniela chama atenção para a maneira que eles saem da vida da suposta amada. “Sem empatia nem cuidado. Ao contrário, terminam com extrema frieza”, completa a psicóloga.
O pesquisador João Luiz Marques menciona a dificuldade de fazer um diagnóstico deste perfil. “Por existir uma mistura de elementos culturais com o quadro compulsivo.” Na sociedade machista, as conquistas masculinas encontram confirmação entre os amigos. “Esse homem pegador é visto, muitas vezes, como um verdadeiro herói”, observa. “Ninguém desconfia de que ele é um narcisista, nem o próprio.” Dono de um perfil no Instagram com quase 60 mil seguidores, o pesquisador de 26 anos tem como objetivo abordar questões relativas à masculinidade tóxica. “Os homens das novas gerações, apesar de uma força conservadora que puxa a gente para trás, estão mudando, aos poucos. Estamos todos precisando falar sobre sentimentos.”