A demanda por alimentos saudáveis e cultivados de formas sustentáveis tem aumentado devido às preocupações ambientais e com a saúde das pessoas, o que influencia a busca por feiras agroecológicas. Uma pesquisa realizada no Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Federal de Lavras (PPGA/UFLA) identificou atributos, consequências e valores pessoais, bem como aspectos ligados à segurança alimentar, que guiam o comportamento de compra dos consumidores de frutas, verduras e legumes em feiras locais. Foram também desenvolvidas e avaliadas estratégias de comunicação capazes de transmitir mensagens efetivas a esse público.
Os locais de análise da pesquisa foram feiras agrícolas locais de três cidades de médio porte de Minas Gerais. Os resultados apontaram que os consumidores valorizam características relativas à origem do produto e à forma como ele é produzido e comercializado (por pequenos produtores, em baixa escala e com uso reduzido de defensivos agrícolas). Eles buscam, também, benefícios individuais, como satisfação com a compra, cuidado com a saúde e o bem-estar, e segurança ao consumir esses alimentos.
Observou-se, também, que os consumidores percebem benefícios sociais, visto que esta é uma forma de apoiar a economia local. Ao abordar a segurança alimentar, os entrevistados destacaram preocupações relacionadas à higiene, organização, exposição e manipulação dos produtos na feira. “No caso, os alimentos não podem estar muito misturados, porque senão um pode atrapalhar o outro. Tudo tem que estar nos seus lugares certinhos, não é? Para poder estar bem organizado”, comentou um dos entrevistados, que teve o nome mantido em sigilo pelo protocolo da pesquisa.
Em busca da melhor estratégia para os anúncios publicitários sobre as feiras
Após a identificação do perfil dos consumidores das feiras livres, foram desenvolvidas e analisadas duas peças publicitárias, ambas criadas por designers profissionais de uma agência de comunicação. Para a primeira delas foi informado apenas o perfil do público e o foco da proposta, seguindo o padrão de desenvolvimento normalmente adotado pela agência.
A segunda peça foi confeccionada a partir da chamada Conceitualização de Meios-Fim dos Componentes da Estratégia de Publicidade (Meccas), que se baseia na percepção de valores pessoais dos consumidores. Essa estrutura possibilita ao estrategista gerar alternativas baseadas nas percepções e motivações do consumidor e no ambiente competitivo do mercado, visando ao desenvolvimento de campanhas publicitárias com mensagens mais persuasivas e alinhadas aos anseios íntimos do público.
O modelo Meccas sugere que uma mensagem publicitária deve: i) basear-se em conhecimento relevante (estrutura cognitiva) para os destinatários; ii) criar uma cadeia completa de meios-fim nas mentes dos destinatários, ou seja, uma cadeia cognitiva que contenha atributos e consequências do produto bem como valores pessoais; iii) associar essa cadeia meios-fim ao objeto da mensagem, utilizando o talento criativo no desenho da estratégia de ligação e na estrutura de execução.
As informações para a construção do modelo Meccas, a partir do qual foi confeccionada essa segunda peça publicitária, foram obtidas por meio da técnica de entrevista laddering, que consiste em um questionamento estruturado, em que se estabelece uma hierarquia de conceitos, formando uma escada (ladder em inglês), do qual o entrevistador consegue extrair mais informações sobre preferências dos entrevistados. Elas foram conduzidas durante a pesquisa, com os consumidores nas feiras livres. O modelo Meccas foi construído com base em uma única cadeia do mapa.
Após a finalização das peças, foi feito um teste de conceito com um grupo focal de dez pessoas consideradas consumidoras assíduas desse tipo de produto. O objetivo foi compreender o impacto gerado por cada uma das imagens sobre o público.
A peça 2 foi vista como mais completa, abordando elementos ausentes na peça 1, como a figura do produtor, formas de pagamento modernas e práticas (Pix e cartão), e maior ênfase na higiene e segurança alimentar. Pode-se concluir que essa segunda imagem foi mais eficiente em transmitir a mensagem desejada, apresentando de forma clara e organizada os atributos, as consequências e os aspectos pessoais valorizados pelos consumidores. “Eu gostei mais desse cartaz, achei bem legal, envolve né as questões que a gente estava sentindo falta no outro, produtor rural, a família e os produtos. O que eu gostei muito é a frase “Faça da saúde da sua família algo natural”, comentou um dos participantes sobre a peça 2.
Em termos gerenciais, a aplicação do modelo Meccas foi avaliada positivamente pela agência, tendo sido destacados benefícios relativos à compreensão do contexto da mensagem, ao processo de criação da peça e à comunicação com o cliente. Possíveis limitações do modelo foram associadas à necessidade de investimento em pesquisa e prazos maiores.
Com relação à peça 1, os participantes destacaram que ela enfatiza a preocupação com a saúde familiar por meio da alimentação, associando isso à qualidade dos produtos naturais e ao custo-benefício. Além disso, a imagem da família de diferentes idades e a presença de crianças felizes consumindo produtos de feira foram vistas positivamente, reforçando a ideia de produtos saudáveis.
A peça 1 também foi elogiada por abordar a qualidade, procedência e segurança desses alimentos, embora alguns participantes tenham sugerido que esses elementos poderiam ser mais destacados. Houve, ainda, a recomendação de incluir a figura do produtor na propaganda para reforçar a procedência e a segurança dos produtos, o que exigiria uma mudança de posicionamento.
A equipe e a metodologia de pesquisa
A pesquisa faz parte da tese de doutorado de Rita de Cássia Leal Campos, sob orientação do professor da Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas (FCSA/UFLA) Luiz Henrique de Barros Vilas Boas. O trabalho se alinha às pesquisas realizadas pelo Grupo de Estudos em Marketing e Comportamento do Consumidor (Gecom), do Programa de Pós-Graduação em Administração da UFLA. Ele também faz parte do projeto de pesquisa “Personal values, motivations and preference for food consumption in regional markets: consumer perception and demands related to food safety aspects”, coordenado pelo professor Luiz Henrique em parceria com a Purdue University. “O estudo faz uma articulação entre as perspectivas social, econômica e política ao fornecer subsídios para a promoção do consumo de frutas, legumes e verduras em feiras locais, considerando aspectos de segurança alimentar, nutrição e saúde”, comenta Rita.
A pesquisa, que teve início em 2020, seguiu a abordagem qualitativa e foi dividida em três etapas. A primeira foi uma revisão integrativa que buscou analisar a produção científica internacional acerca dos valores pessoais como guias de comportamento no que diz respeito à segurança alimentar.
As etapas de aplicação empírica da Teoria da Cadeia Meios-Fim (MEC) visando determinar a estrutura cognitiva que motiva o comportamento dos consumidores e entrevistas por meio da técnica laddering, e o desenvolvimento e análise das peças publicitárias, descritas anteriormente, referem-se às etapas 2 e 3 respectivamente.
De acordo com Rita, os resultados da tese “preenchem uma lacuna na literatura ao abordarem uma compreensão aprofundada sobre a interconexão entre os valores pessoais dos consumidores, a busca por segurança alimentar e a eficácia das estratégias de comunicação em feiras locais de frutas, legumes e verduras. Além disso, essas informações podem ser úteis para produtores, profissionais de marketing e formuladores de políticas públicas no sentido de promover os produtos vendidos em feiras locais e incentivar a melhoria das práticas de segurança alimentar”.
A pesquisa foi concluída em dezembro de 2023, e teve resultados publicados no Qualitative Market Research: An International Journal (QMR), um periódico internacional conceituado da área de marketing .