ESCLARECENDO

Diferentemente do que tem circulado nas redes sociais, a presidente Dilma Roussef não isentou a Samarco das responsabilidades com relação ao desastre de Mariana. Nem cabe a ela tamanha autoridade. Fui procurar e encontrei respostas na BBC Brasil:

A Samarco já é considerada a principal responsável pelo ocorrido, segundo a promotora de Justiça do Ministério Público do Espírito Santo Isabela Cordeiro.

“Costumamos dizer que a empresa é responsável, mesmo se tivesse adotado todas as medidas necessárias de prevenção. Ela é responsável por qualquer evento danoso ambiental ou social decorrente da atividade dela. Não tem desculpa”, disse à BBC Brasil.

É por este motivo que a empresa já recebeu multas preliminares do Ibama e assinou termos, também preliminares, com os MPs dos dois Estados afetados pelo desastre ambiental, nos quais se compromete a realizar ações de emergência, de reparação e de prevenção nas regiões onde a lama ainda não havia chegado.

Outra questão é se a empresa será considerada criminosa. Quem determina oficialmente se o rompimento da barragem foi um crime ambiental é o inquérito da Polícia Federal que está em curso.

Questionada pela BBC Brasil, a PF não quis comentar a investigação, mas confirmou que apura a “possível ocorrência do delito ambiental previsto no artigo 54, § 2º, incisos I, II e III, e 62, da Lei nº 9.605/98, tendo em vista suposta incidência de crime ambiental”.

Caso a Polícia Federal determine a existência de crime, a Samarco terá que responder a um processo penal e seus dirigentes, assim como a Vale e a BHP Billiton, podem ser condenados.

Mas mesmo que isso não aconteça, a empresa continuará tendo que responder a exigências dos MPs de ambos os Estados através de outros acordos, de ações cíveis ou até de ações judiciais individuais e coletivas de pessoas afetadas pelo desastre.

Que tipo de multas podem ser aplicadas à empresa?

Até o momento, a Samarco foi multada em R$ 250 milhões pelo Ibama – cinco multas de R$ 50 milhões – mas essa é apenas a primeira que o órgão pode aplicar.

“O Ibama pode aplicar pelo menos outras dez penalidades previstas pela legislação, que vão de multas diárias a até exigir o fechamento da empresa” disse à BBC Brasil o advogado do Instituto Socioambiental Mauricio Guetta.

De acordo com a coordenadora geral de emergências ambientais do Ibama, Fernanda Pirillo, o órgão já prevê a cobrança de uma nova multa nas próximas semanas por destruição de área de preservação permanente nas margens do Rio Doce em Minas Gerais, cujo valor ainda não foi determinado. “Vai depender do tamanho da área, que está sendo calculado”, afirmou à BBC Brasil.

No entanto, é um desafio garantir que as multas sejam pagas, o que nem sempre acontece. “Temos uma boa legislação e muito avançada em relação à responsabilização, mas temos um problema de implementação”, diz Guetta.

“Cerca de 97% das multas aplicadas pelo Ibama não são pagas pelos infratores. É um dado chocante.”

A Samarco tem 20 dias para apresentar recurso contra o pagamento de cada uma das cinco multas preliminares. Depois disso, caso não seja atendida, ainda pode apresentar um segundo recurso antes de ter de, finalmente, fazer o pagamento.

Questionada pela BBC Brasil, a empresa não respondeu se pretende pagar, nem quando o fará.

Em um termo de compromisso proposto pelo Ministério Público de Minas Gerais e assinado pela Samarco no dia 16 de novembro, a empresa se compromete a criar um fundo de R$ 1 bilhão que deve ser destinado a ações de emergência no Estado.

O termo não especifica quais seriam essas ações, mas diz que a empresa terá de comprovar que o dinheiro está sendo gasto em “medidas de prevenção, contenção, mitigação, reparação e compensação dos danos ambientais ou socioambientais”. A multa prevista pelo não cumprimento destas medidas em seus prazos é de R$ 200 mil por dia.

Já o termo assinado com o MP do Espírito Santo no mesmo dia não fala de valores específicos, mas prevê que a empresa pague por análises do ambiente afetado pela lama, abastecimento de água de cidades impactadas, coleta de animais silvestres e dezenas de outras ações detalhadas – desde os meios de transporte até alimentação, hospedagem e instrumentos dos técnicos e profissionais envolvidos em cada uma delas.

O não cumprimento de cada uma das ações em seu prazo gera uma multa de R$ 1 milhão por dia no acordo firmado com no Espírito Santo. Segundo Isabela Cordeiro, a empresa é notificada por e-mail do MP toda vez que houver uma infração, e deve calcular a soma das multas diárias mais adiante.

E esses são apenas os custos das ações de emergência, que devem ocorrer pelo menos até que a lama deixe de passar pelo Rio Doce, segundo a promotora.

“Ainda estamos negociando um fundo como o de Minas, para garantir que a empresa vai arcar com essas providências”, afirmou Cordeiro. Ela disse ainda que um adendo ao termo deve garantir uma renda mínima às pessoas que sobrevivem das águas do Rio Doce.

A BBC Brasil procurou o Ministério Público de Minas Gerais para questionar por que o acordo com o Estado mais afetado pelo rompimento da barragem não determina especificamente as ações que a empresa deveria priorizar e por que a multa proposta pelo descumprimento dessas ações é tão menor que a do Espírito Santo. No entanto, não foi atendida pelo órgão até o fechamento da reportagem.

Para além da situação de emergência, no entanto, está a parte mais difícil: a avaliação do tamanho do problema e o cálculo do valor das perdas.

“Impactos sobre atividades produtivas são mais fáceis de calcular, mas estimar o valor dos recursos naturais é muito mais complicado. Quanto custa um manguezal, por exemplo?”, questiona a engenheira ambiental Alessandra Magrini, da Coppe (UFRJ), que realizou os cálculos da perda ocasionada pelo derramamento de 1,3 milhão de litros de petróleo na Baía de Guanabara pela Petrobras, em 2000.

“É preciso estimar as funções ambientais de cada recurso natural e ver como se calcula o dano. O Brasil não tem prática nesta avaliação”, afirma.

É por este motivo, segundo Magrini, que ainda é cedo para dizer quanto a Samarco, a Vale e a BHP Billiton terão de gastar com o incidente. Da mesma forma, é difícil fazer comparações com o que multinacionais gastaram com incidentes em outros países.

“Cada acidente é um acidente, com suas características. Mas em todos eles, contabilizar as perdas leva tempo. Isso não vai terminar hoje, vai ter repercussões por muitos anos.”

Quem está avaliando o impacto do desastre?

Em desastres ambientais de grande proporção, é comum que existam diversos laudos técnicos sendo preparados simultaneamente por equipes diferentes, de acordo com Magrini.

O desafio é coordenar esses esforços e reunir os dados para poder estimar o tamanho das perdas e o tipo de ressarcimento – em dinheiro e em ações de recuperação – que será preciso cobrar da empresa.

“A responsabilidade por fazer e por pagar é da empresa, mas os governos federal e estaduais precisam de um plano de ação para fiscalizar suas ações e instituir um estudo de avaliação do dano”, afirma.

Na última terça-feira, Kleber Terra, da Samarco, afirmou que a empresa tem 162 pontos de monitoramento de água ao longo do Rio Doce e equipes coletando amostras, com “uma série de empresas mobilizadas”.

Equipes do Ibama também estão realizando suas próprias medições e análises em toda a extensão do rio, de acordo com a coordenadora Fernanda Pirillo. Atualmente, há pelo menos cinco equipes, com cerca de 20 técnicos, divididas da seguinte forma:

• Pelo menos quatro pessoas em Mariana, no gabinete de crise;

• Duas duplas percorrendo as margens do Rio Doce em MG e ES, verificando se há animais silvestres ou domésticos a serem resgatados;

• Uma equipe de cinco pessoas no Espírito Santo, orientando o resgate de espécies nativas e raras de peixes, que serão transferidos para tanques e usados em repovoamento;

• Três técnicos acompanhando as tentativas de retenção da lama que a Samarco está fazendo no Espírito Santo;

• Cinco pessoas fazendo um mapeamento aéreo da região afetada.

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